domingo, 8 de março de 2015

Retrocesso mundial nos direitos das mulheres está a ter um impacto devastador


Assiste-se atualmente a um recuo vicioso que ameaça retirar às mulheres e raparigas os seus direitos, duas décadas depois de ter sido adotado um acordo global histórico na igualdade de género, alerta a Amnistia Internacional neste Dia Internacional da Mulher, 8 de março, e ao aproximar-se uma importante cimeira sobre estas questões que irá realizar-se nas Nações Unidas em Nova Iorque.

A organização de direitos humanos insta os Governos do mundo inteiro a construírem sobre os progressos já feitos em matéria de direitos das mulheres e a agirem urgentemente de forma a honrarem esses compromissos. “Há 20 anos, os líderes mundiais reuniram-se em Pequim e fizeram a promessa de proteger e promover os direitos das mulheres e raparigas em todo o mundo. Mas hoje, ao assinalarmos o Dia Internacional da Mulher, estamos a assistir a um retrocesso em muitos países nos avanços que se tinham feito nos direitos das mulheres”, avalia a diretora do programa Género, Sexualidade e Identidade da Amnistia Internacional, Lucy Freeman.

“Embora as conquistas feitas desde a adoção da Declaração de Pequim sejam muito significativas, uma total e verdadeira igualdade de género ainda não foi alcançada em nenhum país do mundo, e os direitos de mulheres e raparigas estão ameaçados”, explica a perita.

Num momento em que a Comissão das Nações Unidas sobre o Estatuto da Mulher avalia os progressos feitos no âmbito da Declaração e da Plataforma de Ação de Pequim, adotada em 1995 – e o organismo fará na segunda-feira, 9 de março, uma declaração sobre essa avaliação –, a Amnistia Internacional alerta que os conflitos e o aumento do extremismo violento expõem um número muitíssimo elevado de mulheres a múltiplos abusos de direitos humanos, incluindo a violação, raptos e escravidão sexual.

Mulheres no mundo inteiro continuam a enfrentar discriminação, é-lhes negado acesso igual à participação na vida pública e política e são alvo de violência e abusos sexuais ou com base no género tanto em casa como em lugares públicos. Os defensores de direitos humanos das mulheres enfrentam ameaças, intimidação e ataques, às vezes pagando mesmo com as próprias vidas os esforços que fazem em prol dos progressos da igualdade de género.
As mulheres nas zonas de conflito

Em zonas mergulhadas em conflito como o Afeganistão, o Sudão do Sul, a República Centro Africana, a República Democrática do Congo, o nordeste da Nigéria, e em regiões sob o controlo do grupo armado auto designado Estado Islâmico e outros grupos armados, verifica-se uma escalada na violência contra as mulheres e raparigas, incluindo violações, escravidão sexual e casamentos forçados.

Sobreviventes destes abusos veem ser-lhes negado acesso à justiça com frequência, enquanto os responsáveis pelos abusos se escapam impunes. As populações de mulheres deslocadas e refugiadas por causa dos conflitos armados estão em especial risco. As mulheres nos cenários de guerra e pós-guerra são excluídas das conversações de paz e cessar-fogo.
Ameaças aos direitos sexuais e reprodutivos

Raparigas e mulheres continuam a ser alvos de violência com base no género e outras violações flagrantes de direitos humanos sustentadas em ideias de que tais práticas se justificam pela tradição, os costumes ou a religião dos povos – é o caso dos casamentos forçados, da mutilação genital feminina e dos crimes cometidos em nome de uma suposta “honra”.

Alguns governos continuam a tentar diluir as obrigações e compromissos internacionais que anteriormente assumiram no que toca ao acesso das mulheres à contraceção e à interrupção voluntária da gravidez, disfarçando essa conduta com argumentações que evocam “valores tradicionais” ou “a proteção da família”.

No mundo inteiro, a capacidade das mulheres tomarem decisões informadas sobre os seus próprios corpos está sob uma cada vez maior pressão. A possibilidade de terem uma palavra a dizer sobre as leis e as políticas que afectam as suas vidas é restringida. E em algumas partes do mundo as mulheres são mesmo presas se são suspeitas de abortar.
Chegou a hora de agir

A Comissão das Nações Unidas sobre o Estatuto da Mulher vai não só olhar para trás, para os progressos feitos ao longo destes 20 anos na concretização e aplicação da Declaração de Pequim, mas também para a frente, para os caminhos que é necessário fazer para alcançar maior igualdade de género.

“Instamos os governos do mundo inteiro a honrarem as promessas, feitas há décadas, de protegerem os direitos das mulheres e raparigas. Os líderes têm de dizer que os direitos das mulheres são direitos humanos e agir urgentemente para que os direitos das mulheres e das raparigas sejam exercidos em pleno”, defende Lucy Freeman.

A Amnistia Internacional urge os Estados a:

- protegerem os direitos das mulheres e das raparigas que vivem em situações de conflito, no que se inclui a sua participação em todos os níveis de tomada de decisão;

- porem fim às práticas nocivas e a quaisquer tentativas de as justificar invocando tradições, costumes, culturas ou religiões;

- porem medidas em prática que previnam e protejam as mulheres e raparigas de violência baseada no género e levarem os responsáveis por tais atos à justiça;

- apoiarem e fazerem valer os direitos de mulheres e raparigas a tomarem decisões livres sobre a sua sexualidade, os seus corpos e a sua saúde, e abolirem leis que limitem essas mesmas decisões;

- promoverem e habilitarem a capacidade das mulheres em participarem nos processos de tomada de decisões e na liderança, e lutarem contra os estereótipos negativos de género;

- fomentarem e protegerem o trabalho dos defensores dos direitos humanos das mulheres.

Além destes apelos aos líderes mundiais, a Amnistia Internacional lançou um manifesto integrado na campanha global O Meu Corpo, os Meus Direitos, onde se urge os governos a agirem de forma a honrarem as obrigações assumidas em matéria de direitos sexuais e reprodutivos. (Na foto, a bailarina islandesa Erna Ómarsdóttir, fotografada numa série de retratos comissionada pela Amnistia Internacional Islândia para a campanha O Meu Corpo, os Meus Direitos)

“O direito de todas as mulheres e raparigas a tomarem decisões informadas sobre os seus próprios corpos está sob um ataque implacável com muitos governos e outros agentes da sociedade a tentarem cada vez mais controlar e criminalizar a sexualidade das mulheres e a reprodução”, critica a diretora do programa Género, Sexualidade e Identidade da Amnistia Internacional.

“Este manifesto elenca os padrões mínimos em que todos os Estados têm de se comprometer para garantir direitos sexuais e reprodutivos para todos”, remata Lucy Freeman.

Assine o manifesto O Meu Corpo, os Meus Direitos! E contribua para esta campanha global de defesa dos direitos das raparigas e mulheres em todo o mundo, também com um donativo.

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